O PAÍS enfrenta o estigma imputado aos biocombustíveis como responsáveis pela alta dos preços dos alimentos no mundo, que afeta as populações pobres. Partindo do FMI (Fundo Monetário Internacional), essa informação não tem muita credibilidade, já que sua política de ajuste das economias dos países em desenvolvimento agravou a pobreza.
É possível expandir a produção de álcool no Brasil. A lavoura da cana ocupa 7 milhões de hectares, dos quais 3 milhões de hectares para açúcar e 4 milhões de hectares para álcool, enquanto só a soja, a maior parte para exportação, ocupa 23 milhões de hectares. Segundo o IBGE, temos 152 milhões de hectares de área agricultável, dos quais são utilizados 62 milhões de hectares, e há 177 milhões de hectares de pastagens. Excluídos os 440 milhões de hectares de florestas nativas, dispõem-se de 90 milhões de hectares para expandir a agricultura sem desmatamento. Apenas uma parte dessas áreas é adequada à cana e é econômica e socialmente viável para biocombustíveis, como álcool e biodiesel. Este último em grande parte vem da soja, que, ao contrário da cana, pressiona o desmatamento na Amazônia.
O álcool de milho nos EUA é subsidiado e, diferentemente do brasileiro, afeta o preço do grão e se reflete em outros alimentos. Ademais, a cana captura CO2 do ar no seu crescimento, igualando aproximadamente a emissão na produção e no consumo do álcool. Logo, ao substituir a gasolina, evita emissões de CO2, que contribuem para o aquecimento global. O mercado internacional crescerá se forem removidos os subsídios nos países ricos. Os EUA consomem um pouco mais de álcool automotivo que o Brasil, mas o percentual dele na gasolina é baixo. Seu consumo de gasolina é de 580 bilhões de litros por ano. Esse percentual deve aumentar para 20%. Considerando 1,3 litro de álcool para cada litro de gasolina, daria algo como 150 bilhões de litros ao ano de álcool, oito vezes mais do que a atual produção brasileira, de 18 bilhões de litros por ano. Levará um tempo para isso e o Brasil poderá exportar mais álcool, mas não é razoável suprir todo esse mercado.
Outro desafio na área energética é negociar o pleito do presidente Fernando Lugo, eleito no Paraguai, em relação a Itaipu Binacional, que tem dívida de US$ 19 bilhões com a Eletrobrás e com o Tesouro brasileiro. Foi o Brasil que construiu a usina e obteve seu financiamento.
Essa dívida é amortizada pela tarifa paga pelos consumidores, que na sua maciça maioria são brasileiros.
Metade da energia gerada por Itaipu pertence ao Brasil e metade ao Paraguai, que consome cerca de 5% dela. Pelo acordo, a Eletrobrás compra os restantes 95%, pagando um valor que por muitos anos era alto.
Uma cota compulsória da energia de Itaipu teve de ser estabelecida no governo Geisel para empresas elétricas brasileiras. Hoje não é mais cara, comparativamente, pois a energia elétrica no Brasil subiu de preço desde as privatizações. A energia de Itaipu custa US$ 42 o MWh (megawatt-hora), preço semelhante ao previsto para a geração pela hidrelétrica de Santo Antônio, a ser construída no rio Madeira (R$ 78 o MWh). O Itamaraty deve chegar a bom termo na negociação, como fez no caso do gás natural boliviano.
O que não deverá ser admitido é que a energia possa ser colocada no mercado para a Argentina e o Chile, perdendo o Brasil o direito de dispor dela por meio da Eletrobrás. Itaipu supre cerca de 19% da energia elétrica do país.
LUIZ PINGUELLI ROSA , 66, físico, é diretor da Coppe-UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro) e secretário do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas. Foi presidente da Eletrobrás (2003-04). É autor do livro "Tecnociências e Humanidades".
Fonte: Folha de São paulo
segunda-feira, 28 de abril de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário