quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

À ESPERA DO BIODIESEL

Um combustível de fonte renovável e limpo, que reduz a emissão de poluentes, principalmente o CO2, é um dos assuntos mais discutidos em todo o Brasil, desde o palácio da república até o plantador de cana, passando pelas indústrias que já trabalham (ou estão se preparando para trabalhar) diretamente com esse novo combustível: os fabricantes de filtros e seus sistemas.

O Biodiesel é um combustível produzido a partir de óleos vegetais extraídos de diversas matérias-primas. A lista é extensa: palma, mamona, soja, girassol, canola, buriti, dendê, palmiste, babaçú, amendoim, nabo forrageiro, linhaça, sebo ou gordura animal, entre outros.

A diversidade de matéria-prima é um dos pontos chaves para o avanço do biodiesel no Brasil. Essa é a conclusão de um estudo realizado pelo grupo de Economia da Energia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Segundo a pesquisa, as condições climáticas do país tornam-o extremamente favorável à produção das principais oleaginosas.

Em São Paulo, as plantações de soja mantêm certa predominância, já no Nordeste a mamona e o algodão são apontados como as matérias-primas mais viáveis. Sendo assim, cada estado terá um tipo de lavoura como fonte de matéria-prima. “Com a alta no preço do petróleo e com a perspectiva de duração desse combustível por pouco mais de meio século, tendo em vista as reservas atuais, o Biodiesel vem preencher uma importante lacuna na cadeia energética mundial”, conta Alexandre Sikler, responsável pela Engenharia do produto e testes da divisão filtros da Mahle Metal Leve.
Pablo Soboleff é Engenheiro de aplicação da Hengst, fabricante de filtros e sistemas de filtração para a indústria automobilística, como também para aplicações na área industrial e de bens de consumo. Segundo ele, a adaptação é essencial para o segmento de filtros. “Os fabricantes de sistemas de filtragem e componentes de interface que não estiverem adaptados não serão competitivos nesse mercado”, anuncia.

Histórico
Durante uma exposição em Paris, em 1900, um motor diesel foi apresentado ao público funcionando com óleo de amendoim. Hoje, 107 anos depois, a França utiliza o Biodiesel de forma obrigatória em misturas do Tipo B5. Esse 5 refere-se à porcentagem de Biodiesel que consta no diesel. Já nos EUA, o governo autorizou a utilização em misturas de até 20% (B20) nas frotas de veículos federais e estaduais.

A Alemanha é considerado o maior país produtor e consumidor do combustível do mundo, responsável por cerca de 42% da população mundial. Soboleff, da Hengst, empresa originária da Alemanha comenta que a aplicação de 100% de Biodiesel já é uma realidade por lá, respeitadas as diferenças climáticas e de composição do combustível entre o país e o Brasil. “Os produtos Hengst são totalmente compatíveis com utilização de Biodiesel, segundo desenvolvimentos realizados na Europa. No Brasil estão sendo realizados diversos estudos e testes que até o momento comprovam igualmente a compatibilidade de nossos produtos, porém adaptações às particularidades de aplicação e composição provavelmente serão necessárias”, esclarece.

Em todo o mercado internacional, o combustível já é utilizado em veículos de passeio, veículos de linha pesada, transporte público e na geração de energia.

No Brasil
Desde a década de 20, o INT - Instituto Nacional de Tecnologia – já estudava e testava combustíveis alternativos e renováveis. Durante as ultimas décadas, diversos projetos e pesquisas foram apresentados, aprimorando cada vez mais o processo de fabricação, impulsionados pelo Programa Nacional de Produção de Óleos Vegetais para Fins Energéticos (Pro-óleo), de 1980. Entre os objetivos do programa estava a substituição do óleo diesel por óleos vegetais, em mistura de até 30%.
Diferente do combustível produzido e utilizado na Europa, graças às matérias-primas, o Biodiesel brasileiro possui hoje seu próprio projeto, o PNPB - Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel – elaborado pelo governo federal e que prevê a produção e uso a partir de diferentes fontes oleaginosas e em diversas regiões, com enfoque na inclusão social e no desenvolvimento regional.

Segundo Sikler, da Mahle, o Biodiesel tornou-se rapidamente uma das mais atrativas tecnologias, tendo a atenção de grandes empresas multinacionais e nacionais. “A entrada do Biodiesel é importante para que o país se torne autosuficiente em petróleo e desenvolva, como já visto com o flex fuel, produtos tecnologicamente diferenciados para atender ao mercado nacional podendo posteriormente serem exportados para Europa e EUA”, explica.

Com cada vez mais pesquisas e investimentos na área, o Brasil cresce rapidamente quanto ao novo combustível. Segundo a Petrobras, o Biodiesel já está disponível em mais de 3.700 postos (na proporção de 2%), o que corresponde a uma produção de 600 milhões de litros. A Companhia investiu, nos últimos dois anos, cerca de R$ 20 milhões para tornar suas instalações aptas a receber o combustível. “Vejo o Biodiesel como um meio muito viável, assim como o álcool, porém, a vontade política dos governos e empresários deve ser clara”, opina Carlos A. Canova, Diretor de desenvolvimento do produto da Sogefi Filtration, que possui seu produto, Filtros Fram, como um dos filtros automotivos mais conhecidos.

O Professor Luis Novazzi, um dos participantes do grupo de pesquisa sobre o Biodiesel da FEI (Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana), em São Bernardo do Campo – SP, acredita que mesmo com o crescimento em ritmo acelerado e várias empresas investindo pesadamente na área, a impressão é que a demanda pelo B2 ainda deve superar a oferta por um tempo razoável no país. “No mundo, o Biodiesel é bastante utilizado, tendo em vista que uma parte significativa de seus automóveis já era movida a diesel, contrariamente ao Brasil. Os EUA e países asiáticos têm excelentes pesquisas na área de Biodiesel, mas a disponibilidade para os consumidores é ainda restrita”, explica.

Para Marina Savelli, à frente dos negócios da Cummins Filtration na América Latina, o Biodiesel é um avanço para o país “A conquista da independência da utilização de produtos derivados do petróleo, assim como aconteceu com o álcool, terá seu espaço entre os consumidores”, comenta.

Principais Vantagens do Biodiesel

• É um ótimo lubrificante e pode aumentar a vida útil do motor.
• É biodegradável, não-tóxico e essencialmente livre de enxofre e aromáticos.
• Tem baixo risco de explosão.
• A viabilidade do uso direto foi comprovada na avaliação dos componentes do motor, que não apresentou qualquer tipo de resíduo que comprometesse o desempenho.
• O produtor rural estará produzindo seu combustível.
• Pouca emissão de partículas de carvão. O Biodiesel é um éster e, por isso, já tem dois átomos de oxigênio na molécula.
• A combustão é completa na queima do Biodiesel.
• É necessária uma quantidade de oxigênio menor que a do diesel.
• É uma fonte de energia renovável, a exemplo
de todos os produtos originários do ciclo produtivo da agroindústria. Nesse ciclo, a
energia que está armazenada nos vegetais, no
caso o grão da soja, é transformada em combustível e, depois da combustão, uma parte destina-se à operação de um sistema como um motor, e outra retorna para a nova plantação na forma de CO2 - que combinado com a energia solar realimenta o ciclo.
• É constituído de carbono neutro. As plantas capturam todo o CO2 emitido pela queima do Biodiesel, separam o CO2 em Carbono e Oxigênio, neutralizando suas emissões.
• Possibilidade de utilização dos créditos de carbono vinculados ao Mecanismo de Desenvolvimento Limpo decorrentes do Protocolo de Kyoto.
• Tecnologia atual permite aos veículos Diesel atender a norma EURO III, dispositivos de retenção de particulados - filtros regenerativos (com B100 poderão operar melhor pela ausência de enxofre e material particulado).
• Lubricidade otimizada.
• Ajuda na eficiência e amplia a vida útil de catalisadores do sistema de escapamento de automóveis.
Fonte: Portal do Biodiesel


Mercado automotivo
Segundo o INT - Instituto Nacional de Tecnologia, uma frota de ônibus da cidade de São Paulo está circulando com uma mistura de Biodiesel do tipo B30 (30% de Biodiesel misturado ao diesel normal). Aos poucos o combustível está se tornando cada vez mais comum e sendo utilizado de maneira mais abrangente. “De qualquer modo, o surgimento do biodiesel é muito positivo para o mercado automotivo, por se tratar de um combustível renovável e por se dispor de tecnologia suficiente para aproveitá-lo”, explica Novazzi.

Essa tecnologia é algo que as empresas fabricantes de filtros automotivos e industriais estão sempre priorizando. Estima-se que para o uso integral do Biodiesel, ou seja, puro, são necessários ajustes técnicos nos veículos, mas isso vai depender muito da tecnologia dos motores, peças e acessórios em questão. As adaptações que o Biodiesel em sua forma pura irá exigir serão pequenas. “Mudanças na vedação e nos polímeros, ajustados no conjunto do motor”, comenta Soboleff.

Segundo Novazzi, não são necessárias modificações no motor ou outras peças até o B10, isto é, até um diesel contendo 10% do combustível. “Entretanto, quando a mistura de Biodiesel começar a se enriquecer muito, serão necessárias pequenas modificações mecânicas e também um aumento significativo da emissão de NOx (número de oxidação) nos fumos da combustão”, explica. “A Cummins Filtration e a Cummins Motores realizaram teste em filtros separadores (água-combustível) e filtros de combustível. Constataram que não há problemas na utilização do Biodiesel para filtros produzidos conforme normas governamentais”, comenta Marina Savelli. A Cummins, considerada uma das maiores fabricantes de motores à diesel e acessórios, rodou mais de 250 mil quilômetros pelo Brasil testando em seus motores a mistura B5.
Canova, da Sogefi Filtration, também confirma que os testes não mostraram necessidades novas até o momento. “Porém, com o aumento gradativo da mistura os filtros, devem ser reavaliados quanto a performance e durabilidade”, completa.
O Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel prevê um aumento gradativo da quantidade de Biodiesel a ser adicionada ao diesel de petróleo. Inicialmente, foi regulamentado o uso opcional de B2 (ou 2% de Biodiesel no óleo diesel), que passará a ser obrigatória nos postos de todo o país, à partir de 2008. Em 2013, data que pode ser antecipada, a porcentagem compulsória será de 5% (B5).

Para Sikler, da Mahle, o combustível surge como um novo desafio a ser vencido devido às suas particularidades, detalhes não existentes no diesel proveniente do petróleo, tais como a formação de sabão e o ataque às borrachas. “Nesses casos, novos materiais foram desenvolvidos para atender às especificações de qualidade dos clientes no mercado original das montadoras e no de reposição”. Segundo Sikler, a Mahle já desenvolve componentes para motores que utilizam Biodiesel na Alemanha e na Europa em geral. No Brasil, testes e desenvolvimento de produtos estão sendo realizados junto às montadoras.

“Obviamente, isso é pura especulação, mas creio que o Biodiesel deve substituir gradativamente o diesel, de modo que daqui a 25 anos tenhamos somente o B100. Nessa época, o petróleo deve continuar a existir, mas será usado em aplicações mais nobres, não como combustível para ser queimado”, opina Novazzi.

Fabricação e composição química
Biodiesel é uma fonte de energia renovável, a exemplo de todos os produtos originários do ciclo produtivo da agroindústria, as plantações não se extinguem, ao contrário do petróleo, que fica cada vez mais escasso no planeta. A substância é obtida por meio de uma reação de transesterificação, entre óleos ou gorduras com álcoois de cadeia curta, como o metanol (CH3OH) ou o etanol (C2H5OH). O esquema abaixo ilustra essa reação:


“Os óleos ou gorduras são triésteres de glicerol e de ácidos graxos de cadeia longa (R1, R2, R3). Essas substâncias reagem com o álcool de cadeia curta, no qual o radical RA representa ou CH3- ou C2H5-“, explica Novazzi. O produto da transesterificação é a glicerina, uma matéria-prima importante para a indústria de cosméticos, e Biodiesel, que quimicamente é classificado como um
éster. “A preocupação quanto a possível influência do Biodiesel nos filtros é com relação aos resíduos gerados no processo de transesterificação, e em que quantidade estarão presentes no produto final. Assim sendo, eles poderão alterar as propriedades de alguns materiais presentes nos filtros como borracha, adesivos, peças metálicas e meios filtrantes”, comenta Edson Manzato, Consultor de Engenharia da SOFAPE – Sociedade Fabricante de Peças – conhecida pelos filtros automotivos Tecfil.

Dos triglicerídeos presentes nessas matérias graxas, ésteres monoalquílicos (como os ésteres de etila e de metila) são produzidos pela reação com um álcool primário (etanol ou metanol) em meio preferencialmente alcalino. “Esses ésteres também podem ser obtidos a partir de ácidos graxos livres, mas, nesse caso, a reação é de esterificação, e sua condução deve se dar em meio preferencialmente ácido”, comenta Manzato.

O Biodiesel pode ser produzido através de catálise homogênea ou catálise heterogênea. Os principais catalisadores heterogêneos são enzimas, silicato de titânio, compostos de metais alcalino terrosos, resinas trocadoras, etc. “A rota heterogênea tem a vantagem de permitir uma glicerina de maior pureza, mas apresenta como desvantagem custos mais altos de investimento inicial, em virtude dos catalisadores. Já a rota homogênea se divide em catálise ácida ou básica, sendo que em termos industriais a última se destaca, pois permite maior velocidade de reação e condições mais amenas de operação”, explica Novazzi. Um dos principais inconvenientes da catálise básica é que pode haver saponificação, diminuindo o rendimento e baixando a qualidade do Biodiesel formado.

Soboleff, da Hengst, empresa que também está realizando testes e verificações de seus produtos ao Biodiesel brasileiro, diz que há características do Biodiesel que devem ser analisados. “Componentes como elastômeros são críticos e devem ser adequadamente testados e desenvolvidos para aplicação com Biodiesel”, comenta.

Grupo de professores e estudantes pesqui-sam biocombustível
A FEI - Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana, em São Bernardo, inaugurou em 2006 o LACOM – Laboratório de Combustíveis – que dará mais espaço para as pes-quisas de um grupo de professores e estudantes da Fundação. Em 2004, os estudos sobre o Biodiesel começaram a ser realizados, trabalhando com diferentes matérias-primas para a produção do combustível. “Desde o início dos trabalhos já avaliamos óleo de soja, óleo de mamona, óleo de girassol, gordura de coco e houve um estudo recente sobre a utilização da gordura de frango para a produção de Biodiesel”, conta Luis Novazzi, um dos professores que participam das pesquisas.
Já com o laboratório, as pesquisas agora estão voltadas para a purificação da glicerina obtida juntamente com o Biodiesel, por ser uma matéria-prima nobre para a indústria. “Vamos começar também a pesquisar a respeito da produção de combustíveis a partir de biomassa, um tema bas-tante relevante no Brasil. Esperamos também nos tornar uma referência na área de biocombustíveis”, orgulha-se Novazzi.


Vantagens ecológicas
Em termos ambientais, o uso do Biodiesel resultará aos poucos em uma significativa redução no padrão de emissões de materiais particulados, óxidos de enxofre e gases que contribuem para o efeito estufa.

O Biodiesel permite que se estabeleça um ciclo fechado de carbono no qual o CO2 é absorvido quando a planta cresce e é liberado quando queimado na combustão do motor. “Seu uso num motor diesel convencional resulta, quando comparado com a queima do diesel mineral, em uma redução substancial de monóxido de carbono e de hidrocarbonetos não queimados”, explica Manzato, da Tecfil.

Marina Savelli, da Cummins Filtration, comenta: “Todo combustível que possa auxiliar no controle ambiental e econômico é positivo”. Quanto ao segmento de filtros, a questão ambiental também deve ser discutida. “É importante também estarmos cada vez mais atentos aos filtros ecológicos, nesta ou em outras aplicações”, diz Canova, da Sogefi Filtration.

Fonte: Revista Meio Filtrante

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