terça-feira, 5 de junho de 2007

Biocombustiveis: Risco ambiental na Amazônia está descartado

A corrida pelo etanol pode afetar mercados e ecossistemas, mas há um risco ambiental que está praticamente descartado por agrônomos e estudiosos do tema. Segundo especialistas, não existe a possibilidade de que a produção de álcool eleve a demanda de cana-de-açúcar no país, a ponto de a plantação invadir áreas florestais — como a região Amazônica. A cana não consegue se desenvolver em áreas tropicais, com chuvas freqüentes e elevada umidade, e mesmo que a prática fosse tentada, a qualidade do produto a ser colhido deixaria a desejar.

“Todos os principais estudos sobre o tema, que levam em conta variações climáticas e características do solo na região amazônica, afastam totalmente qualquer possibilidade de êxito na produção em local de florestas”, diz Oscar Braunbeck, professor da Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Na avaliação de Braunbeck, a necessidade de buscar novas áreas para a cultura da cana nem mesmo existe, visto que há terrenos na região Sudeste que ainda podem ser exploradas para o cultivo do produto. “É preciso lembrar ainda que existem áreas florestais que são reservas legais e, portanto, protegidas da exploração do homem. Não pode simplesmente começar a plantar canas nesses locais”, afirma o pesquisador da Unicamp.

A Amazônia é a região mais rica em biodiversidade do planeta, com um terço das florestas tropicais e mais de 20% das espécies vegetais e animais domundo. Do total de 850 milhões de hectares de terras do Brasil, cerca de 550 milhões de hectares contêm florestas nativas — a Amazônia ocupa dois terços dessa área.

Os primeiros debates em torno da possibilidade de que a região fosse afetada pela expansão na cultura da cana surgiram no ano passado. Com a decisão da Indonésia de reduzir suas áreas florestais para aumentar a plantação de dendê — oleaginosa usada naquele país para a produção de álcool — começaram a aparecer especulações na imprensa estrangeira sobre o risco de que uma situação semelhante acontecesse também no Brasil. O caso do país asiático foi estudado por pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

Na Indonésia, a introdução de grandes áreas de plantio do dendê em áreas de floresta tropical provocou emissão de carbono devido aos desmatamentos.

No entanto, estudo já publicado neste ano — elaborado por mais de 200 pesquisadores de universidades brasileiras — mostra que um “efeito Indonésia” praticamente não existirá no Brasil. O levantamento, realizado por encomenda do Ministério do Meio Ambiente (MMA), destaca que existe uma possibilidade de que a plantação de cana empurre as plantações de soja e a pecuária para áreas florestadas (inclusive na Amazônia). Mas não há informações dos pesquisadores de que isso já estaria acontecendo.

Segundo o trabalho, publicado em março, o cerrado deve ser o bioma mais impactado pela esperada expansão do cultivo da cana-de-açúcar para produção de etanol. Da extensão total de cerca de dois milhões de quilômetros quadrados ocupados pelo cerrado, 20% são considerados áreas de alta importância biológica. E 70% dessas regiões correspondem aos locais onde a cana-de-açúcar encontra condições ideais de cultivo.

Na avaliação de Suzana Kahn Ribeiro, professora do programa de engenharia de transportes da COPPE/UFRJ, num cenário como este é preciso que o poder público atue de maneira a orientar e fiscalizar o zoneamento agrícola no país. “O governo pode e deve interferir nessa discussão, com as atenções voltadas principalmente para áreas onde o ecossistema é mais sensível”, afirma ela.

Ribeiro foi uma das autoras do capítulo relacionado ao tema de transportes do quarto relatório do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas), publicado em maio pela Organização das Nações Unidas.

O ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, tem trabalhado no sentido de esclarecer essa questão dos riscos à Amazônia de uma expansão na cultura da cana. “Esse é o caso clássico da mentira que se repete, e repete, e vira verdade”, ironiza ele. “O açúcar de cana é formado basicamente por sacarose. A sacarose é composta de glicose e frutose unidas. Mas para completar o ciclo de produção precisa de períodos de seca e frio, porque nesse ambiente, ela consegue perder água e a glicose e frutose viram a sacarose”, explica ele.

“Em regiões quentes, onde chove todos os dias, o ciclo da cana simplesmente não se completa. Vira bambu com água doce”, completa ele. Rodrigues é presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo e co-presidente da Comissão Interamericana de Etanol.

Fonte:

Nenhum comentário: